A chamada era inacreditável. Pelo menos pra mim, que estava ainda meio amarga com a ideia de que mais uma vez pessoas foram assassinadas por uma mistura de busca insana por lucros e negligência das autoridades competentes em fiscalizar e punir. Ainda não se falavam dos mortos, eram só desaparecidos, fazia poucas horas que o noticiário tinha voltado para o assunto do dia e já lá estavam fotos, campanha, hashtag e a promoção “incrível” de compra um e doa o outro para as vítimas. Não demorou para receber um outro anúncio, de uma marca de cosméticos, com modelos enlameados e fazendo cara de choro “para homenagear as vítimas”.
Talvez eu esteja na estação errada, pode me corrigir se for o caso, mas não lembro quando foi que crime como o que a Vale vem perpetrando continuamente na mineração virou “acidente ambiental”. Aquilo ali é homicídio culposo, com intensão de matar, não é? Quando foi que para ajudar alguém eu preciso que outras pessoas comprem o meu produto numa campanha nonsense para capitalizar em cima do sentimento de solidariedade mútuo. Tô achando que não estou só na estação errada, acho mesmo é que o trem descarrilhou.
Existem muitas maneiras de ajudar as vítimas de Brumadinho e a sociedade se organizou, mas acredito que a melhor maneira ainda é evitar que mais gente morra como morreu ali. É cobrar, ir para as ruas, exigir mudança na lei e na fiscalização. Não é só chorar e se lamentar agora. doação de dinheiro é bem vinda, mas não é o nosso poder. Dinheiro a Vale tem e tem de sobra! Tem que ter multa, tem que ter punição, tem que ter prisão. Contudo, nossa posição como cidadãos pode ser mais efetiva no sentido de mudar o que vem acontecendo. Crime ambiental é um jeito atenuante de dizer que eles sabiam dos riscos, da eminência da catástrofe e não agiram. Todavia, se as pessoas que sabem que isto pode acontecer, têm relatórios, avisos, análises e tudo o mais e mesmo assim não se movem e deixam ver o que vai dar e dá nisso – até agora 60 mortes e quase 300 desaparecidos – isto é intenção de matar. Ou se fosse outra “pessoa” que não uma das empresas mais ricas do País seria tratado diferente?
Tem uma mãe que não vai abraçar seu filho na hora de dormir, tem uma menininha que vai olhar para os corpos frios dos pais num caixão hoje, tem pais idosos enterrando seus filhos jovens, tem neto chorando em cima do vovô que combinou passar lá pra tomar um café e comer pão de queijo fresquinho. Tem esposa querendo se matar ao ver o mar de lama e saber que não tem mais chances de ver seu marido e seus dois filhos naquele lodo de morte.
Denunciei ao Conar as campanhas que vi e me pronunciei nas redes deles e agora penso o que podemos fazer como sociedade civil organizada para cobrar uma reparação justa à estas vidas. Me dói a dor deles, a morte, o descaso e os abusos em cima da tragédia. Vamos querer chorar com estes irmãos daqui a pouco de novo? Vamos nos conformar e ouvir sempre só um lado da história? E se fosse o seu marido, seu filho, seu avô?
Fabi, eu não tenho conhecimento de meios de auxílio (nem sabia que essa denúncia que você fez era possível.)
Onde eu, e quem mais precisar de orientação, podemos buscar informações para realmente fazer a diferença? Mesmo que seja uma diferença de 0,0001%?
Eu fico triste com essa situação, principalmente por ser bióloga. Eu tento conscientizar as pessoas aos meu redor sobre as questões ambientais e o desleixo da maior parte da população bem como os representantes políticos. Mas as vezes parece que é um trabalho em vão, porque vejo as pessoas alheias a isso e só param para dar atenção quando esse tipo de crime acontece e mesmo assim logo quando para de passar nos noticiários muitos esquecem e só vão lembrar novamente no próximo crime que virar noticia nacional. Eu cobro muito mais de nós que somos cristãos que temos a responsabilidade de cuidar uns dos outros e da terra que Deus nos deu para nosso sustento, pois não lembro ter lido na bíblia que Deus disse para superexplorarmos a terra. Infelizmente se continuarmos com esse descaso com o meio ambiente mais crimes em grande escala irão acontecer , eu sei que não é isso que as pessoas querem escutar, mas se continuar nesse ritmo essa será nossa realidade.